
Liber Falxifer I: O Livro do Ceifador Sinistro
Por N.A.A.-218. Tradução de Ícaro Aron Soares, @icaroaronsoares, @conhecimentosproibidos e @magiasinistra.
Eu oro a ti, ó santíssimo Santo dos Assassinos
Poderoso Senhor da Luz Ctônica
Abra os portões que bloqueiam meu caminho
E me abençoe nesta noite sem estrelas!
Eu oro a você, ó Santo dos Assassinos
Empreste poder ao meu rito funesto
Desvele para mim seus mistérios encapuzados ó poderoso
Manejador da Foice Sangrenta!
Deixe sua lâmina cortar a colheita
Fira o inimigo para a defesa de seus servos
Deixe-os todos sucumbir ao seu poder mortal
Nesta noite escura do Solstício de Inverno
Quando a colheita perniciosa começará!
Mestre da Foice Avermelhada
Rei Coroado de Espinhos dos Mortos Poderosos
Deixe sua foice cair sobre eles
E corte agora o fio tênue da vida!
AS ORIGENS DO CULTO
O culto do Señor la Muerte consiste em centenas de milhares de seguidores que estão espalhados por toda a Argentina e países vizinhos. Esses devotos adoram e louvam de todo o coração o Portador da Foice, cuja magia é invocada ritualmente para ganhar dinheiro e riquezas, atrair a pessoa que amam, abrir os caminhos para a felicidade e o sucesso, protegê-los contra todos os perigos, ajudá-los a adquirir poder, curar e banir doenças, lançar ou desviar maldições e dominar ou aniquilar seus inimigos.
Dentro deste culto, o Señor la Muerte é representado pela imagem de um esqueleto, muitas vezes encapuzado de preto, e segurando uma foice em uma de suas mãos. Acredita-se que as origens tanto desta representação como da forma atual do culto do Señor la Muerte tenham se originado em 1767. Foi nesse ano que o rei Carlos III da Espanha deu a ordem de expulsão e perseguição dos jesuítas que haviam se estabelecido em Cuenca del Plata. Esta decisão política foi tomada pelo fato de que os jesuítas no Paraguai e na Argentina tinham, naquele momento, conquistado poder, riqueza e influência suficientes para preocupar a Igreja Católica, que por sua vez convenceu o monarca espanhol a agir contra os jesuítas em uma campanha visando removê-los da colônia e confiscar todas as suas riquezas.
Esses jesuítas, que com a ajuda das tribos locais dos índios guaranis, construíram muitas igrejas e templos ricamente adornados, recusaram-se a se render à Espanha. Isso resultou em uma abordagem ainda mais contundente do rei Carlos, que mais ou menos declarou guerra aos jesuítas e a todos os seus seguidores. Com seu poder militar superior, e liderada pelo general Carlos Francisco de Croix, a força militar espanhola exterminou a maioria dos jesuítas, confiscaram suas riquezas, e acabaram incendiando muitas de suas igrejas e templos.
Em um dos mais importantes desses templos havia um ícone muito especial esculpido na madeira sagrada da árvore Palo Santo. Este ícone em tamanho real representava Jesus, Satã e a Morte na forma do Ceifador Esquelético de Almas. O próprio grupo de índios guaranis que esculpiu este ícone para os jesuítas conseguiu salvar a imagem de madeira dos incêndios que consumiram o templo. Eles trouxeram o grande ícone com eles para a selva e, antes de voltar para suas respectivas aldeias, dividiram a imagem esculpida em três partes separadas. Eles então dividiram as três partes entre si para que a primeira tribo ficasse com a imagem de Jesus, a segunda tribo ficasse com a imagem do Diabo com chifres e a terceira tribo ficasse com a imagem da Morte, na forma familiar do esqueleto armado com uma foice.
Assim, os três cultos de Señor Jesus, Señor Diablo/Satã e Señor la Muerte evoluíram entre essas tribos dos guaranis. Todos os três cultos eram mais pagãos do que cristãos, pois tinham conexões mais profundas com sua própria religião e magia xamânicas antigas, do que com a religião à qual os jesuítas tentaram convertê-los.
De acordo com a tradição popular, a linhagem do culto moderno do Señor la Muerte remonta diretamente à tribo guarani que decidiu equiparar o Esqueleto Portador da Foice com seu próprio antigo deus da morte e venerá-lo como um fetiche mágico, atribuído com o poder de proteger os fiéis contra a ‘morte ruim’ e punir todos os seus inimigos.
Além disso, influências de religiões e sistemas de feitiçaria afro-brasileiras podem ser vistas dentro de certas manifestações do culto do Señor la Muerte na Argentina, e alguns acreditam que também foram espalhadas para a Argentina pelos guaranis.
Por influência das tradições africanas, alguns seguidores do Señor la Muerte O compararam ou identificaram o Senhor da Morte como um Exu. Os Exus com os quais o SLM mais se identifica são os ligados aos cemitérios e as linhas esqueléticas de Kalunga e Caveira, como Exu Senhor da Morte, Exu Morte, Exu Caveira, Exu Tatá Caveira, e o governante das almas dos mortos, Exu Rei das Almas Omulu.
Em algumas partes da Argentina, esse sincretismo se desenvolveu de maneira bastante natural por causa das semelhanças óbvias e simples que existem entre os dois cultos. Por exemplo, segunda-feira é dia de Exu e SLM, ambos utilizam talismãs e velas pretos e vermelhos ou pretos e brancos, e ambos recebem oferendas de tabaco, cravos vermelhos, velas vermelhas e pretas, licor, cerveja, óleo de palma, costeletas de porco fritas ou cruas e comida picante.
Assim como Exu, SLM é visto como um potencial ‘abridor de caminhos’ que detém as chaves de todas as estradas e portões trancados, e tem o poder de conceder bênçãos e trazer a morte. Assim como Exu usa seu tridente para remover todos os obstáculos que bloqueiam o caminho, SLM usa Sua poderosa foice para cortar, transformar, remover ou eliminar aquilo que bloqueia o fluxo de Seu poder. Tanto Exu quanto SLM também são peticionados e pagos por seus favores, que vão desde banimento e cura, até cometer atos de assassinato mágico.
O supracitado sincretismo entre os dois cultos pode ser interessante, mas se considerado a partir da perspectiva iniciática da Quimbanda e suas visões sobre o que Exu realmente é, o sincretismo em questão não será válido. O mesmo vale para a perspectiva mais esotérica do culto ao SLM, que também deixa claro que o sincretismo folclórico-mágico entre Exu e SLM não é bem fundamentado e se baseia apenas nas semelhanças dos atributos externos dos dois cultos.
Na segunda parte deste livro, ofereceremos alguns outros exemplos mais relevantes de divindades às quais o SLM tem sido frequentemente associado, e também apresentaremos a compreensão esotérica de nosso próprio Templo sobre a identidade e as origens de nosso Senhor da Morte.
SOBRE O TRADUTOR
Ícaro Aron Soares, é colaborador fixo do PanDaemonAeon e administrador da Conhecimentos Proibidos e da Magia Sinistra. Siga ele no Instagram em @icaroaronsoares, @conhecimentosproibidos e @magiasinistra.
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