
Metafísica do Sexo
Por Julius Evola. Tradução de Fernando Ribeiro de Melo. Revisão de Ícaro Aron Soares, @icaroaronsoares, @conhecimentosproibidos e @magiasinistra.
Sobre o regime da cópula nas práticas sexuais tântricas e sobre os seus perigos
Tínhamos indicado já que as formas iniciáticas do tantrismo se diferenciavam das orgíacas também através dum regime especial de cópula sexual. Esta atitude particular consiste na inibição da ejaculação, na retenção do sêmen, no momento em que todas as condições emotivas e fisiológicas se encontrariam presentes para que fosse vertido na mulher e a fecundasse. Existe um ponto fundamental sobre o qual concordam os textos principais destas escolas, embora esteja freqüentemente expresso numa linguagem cifrada e mística: o Hathayogapradîpikâ o Gorakshasamhita, os cantos Kâhna, o Subhâçita-samgraha, além de diversas obras do Vajrayâna. No primeiro destes textos prescreve-se que, mesmo se no decorrer do ato sexual o bindu (o sêmen) estiver quase a ser ejaculado na mulher, se deve, por meio dum esforço extremo obrigá-lo a ascender de novo… O yogui que retém o sêmen desta forma vence a morte, pois do mesmo modo que o bindu ejaculado conduz à morte, assim o bindu retido conduz à vida» (40). Existe em tudo isto uma relação evidente com a doutrina da vîrya, a força oculta da virilidade. Não se deve, pois, tomar à letra certas expressões dos textos que nos fazem pensar num processo meramente físico e fisiológico: como se importasse economizar unicamente a substância material do esperma. O que vem indicado a este respeito nos tratados tântricos hindus e também nos tratados taoístas chineses, os quais prescrevem até, por vezes, processos drásticos (como uma intervenção manual no taoísmo, e, no texto hindu acima citado, num estrangulamento do órgão masculino pelo órgão feminino no momento de emissão: produzindo esta ação normalmente um efeito contrário pois, por via de regra, desperta no homem sensações que o levam justamente à crise ejaculatória), tudo isto, repetimo-lo, deverá ser tomado conforme aprouver. Não se deve também imaginar que tudo se passa dum modo grosseiro quando, quer no Hathayogapradîpikâ, quer na Dhyâna-bindu-upanishad se aconselha a suspensão da respiração por meio do processo denominado Kheçari-mudrâ, graças ao qual os faquires e os yogui podem entrar também em catalepsia. E evidente que nesse caso, e tal como afirma o texto, a ejaculação não tem lugar «mesmo quando se é abraçado por uma mulher jovem e ardente». É, contudo, dificilmente concebível que se o homem não se isolar completamente, se não se distancia psiquicamente da situação erótica; isto destruiria, todavia, o processo fundamental de amalgamento fluídico e reduziria o todo a um processo assaz insípido, fazendo quase pensar nas palavras que, segundo uma anedota, Frine teria pronunciado ao recusar-se pagar a aposta que tinha feito com Senócrate, dizendo que «se tinha proposto animar um homem e não uma estátua». A suspensão da respiração, para além de dirigir o pensamento para outras coisas, é um dos meios que os tratados de erótica profana também consideram para impedir ou retardar a emissão do esperma. Os fatos passam-se, porém, de maneira diferente na operação yóguica, por pouco que os aprofundemos. A respiração é também utilizada para que o ato sexual não tenha o seu desenlace corrente e o «sêmen não seja vertido» (41). Não se trata, contudo, de paralisar o processo interior com uma síncope ou uma marcha atrás. Trata-se antes de separar o fato da emoção erótica liminal, da sua condicionalidade fisiológica, quase que obrigatória no homem comum, e que consiste justamente na ejaculação.
Nesta ordem de idéias, a não emissão do sêmen pode ter o sentido quer duma causa, quer dum efeito. Será um efeito quando se encontra presente um desejo particularmente exasperado e subtil (e aprenderemos, em breve, através dum texto, que nos meios tântricos se prevê também um verdadeiro treino preliminar para atear esse desejo). Até no campo da sexualidade profana se verificam casos em que um grau extremo de desejo impede, no homem, o desenlace fisiologicamente normal do ato sexual.
O mesmo fenômeno produz-se também sempre que a consciência se desloca no plano subtil, o que provoca uma certa dissociação entre os processos psíquicos e os processos fisiológicos paralelos.
O mesmo se observa no domínio profano; sabe-se que o emprego de estupefacientes e, por vezes, de bebidas alcoólicas — que constituem meios materiais para provocar uma deslocação parcial, passiva, da consciência comum para o plano subtil — tem como consequência que o homem comum não consiga ejacular durante o ato sexual, ou o faça então com muita dificuldade. Nesta circunstância pode, no entanto, experimentar-se uma forma difusa, extática e prolongada do «prazer», idêntica àquela que se sente, por vezes, em sonho mesmo sem polução, isto é, numa condição que, de novo, corresponde ao estado subtil; foi justamente com o fim de obter este efeito que no ars amandi profano antigo ou oriental se empregaram também certos estupefacientes. Deveremos, pois, ter em mente, que devido a todos os seus pressupostos e à orientação interior particularmente requerida, a operação sexual tântrica se não realiza — como qualquer outra operação mágico-ritual — num estado de consciência habitual, mas sim num estado de embriaguez lúcida, quase de transe (de «embriaguez de luz astral») que comporta a ativação do estado subtil o qual já por si, e segundo o que acabamos de indicar, inibe a crise fisiológica ejaculatória do orgasmo erótico. Esta condição negativa e causa eventual de nevrose para o amante comum cuja finalidade é acelerar o seu orgasmo físico até à brusca e breve satisfação carnal, apresenta-se, ao contrário, nestas práticas, como uma condição positiva, porque facilita a inibição interior, não simplesmente fisiológica, e a transformação consecutiva da força despertada, assim como de toda a experiência provocada pela mulher e pelo ato sexual.
Deve considerar-se, ao mesmo tempo, o segundo aspecto, isto é, a suspensão da emissão seminal agora já não em função do efeito, mas, em certa medida, como causa da deslocação da consciência e, no limite, do fator da transcendência. A intervenção inibitória e violenta daquele que — como se pode ler num texto — não deve perder o autodomínio em qualquer grau de emoção, no momento supremo do ato sexual e do amalgamento com a mulher, pode produzir um traumatismo, uma ruptura de nível da consciência, quase como que uma fulguração representando o grau extremo da crise que já se produz na erótica profana, porém numa condição de passividade, de consciência reduzida e de orgasmo físico do amante. É esse também o objetivo da técnica da suspensão da respiração no momento em que, estando já em curso o processo fisiológico correspondente, estivesse prestes a produzir-se a emissão seminal: de destacar a força despertada por esta condicionalidade fisiológica, levando-a a atuar num plano diferente como força que, por um instante, destroi efetivamente o limite individual, que «mata» ou «faz parar a mente».
Comentando um texto citado por M. Eliade ( 42) diz-se que imobilizando o sêmen, provoca-se também a suspensão do pensamento. O «mental (manas) é morto», (excessus mentis), como sucede porém no êxtase ativo. Contudo — acrescenta-se — , é exatamente nesse momento que começa a absorção do «grão puro do lótus», do rajas feminino.
Voltaremos ainda a este último problema. Entretanto, torna-se evidente, que a essência destas práticas consiste na ativação extrema e consciente do amor «físico» como «força que mata» (que «mata o tirano obscuro», isto é, o Eu individual, segundo a expressão de Gelâleddîn Rúmî) ( 43). A mulher oferece com o seu fluido e com o seu «fogo» uma substância que dissolve e liberta, transformando o veneno em Água da Vida. Este é o motivo pelo qual nos textos do tantrismo budista se atribui à yoguinî (à companheira do yogui) o poder de «libertar a essência do Eu» e se nos apresenta um Buddha que por este meio, isto é, graças ao uso da mulher desperta e atinge o Nirvana ( 44).Neste caso é decisivo o momento do amalgamento completo, a chamada samarasa, termo que Shahidullah traduziu incorretamente, e de modo quase profano, por «identidade de prazer» no ato sexual (45). Trata-se, na realidade, de algo muito mais profundo e radical, até devido ao fato de — diz-se — a sua contrapartida ser a suspensão, a imobilização e a união de çukra e de rajas, termos que indicam o sêmen masculino e feminino. Do mesmo modo que, nas práticas yóguicas a suspensão da respiração está incluída nas técnicas empregadas para o despertar da Kundalinî, o mesmo poder é atribuído à suspensão da respiração e do sêmen no momento supremo do amalgamento erótico; graças a ele será possível despertar igualmente a Kundalinî e provocar a corrente ascendente, fulgurante, da unidade. Nesse momento a «identidade de prazer» (dos dois) deixará de ser a identidade espasmódica e carnal de há uns instantes, após a qual o processo se esgota e cessa a união. Em lugar dum fim, torna-se um início, e até o sukha o prazer, se verifica o arôpa, isto é, uma transubstanciação. Esse prazer «fixou-se», a seu modo, num estado contínuo («sem aumento ou diminuição») o qual representa a dimensão transcendente de toda a experiência. É como se, sob este aspecto, a união se tivesse realizado num plano não físico sem ficar limitada a um único momento; fala-se de sahaja-sukha, isto é, do prazer-êxtase «não gerado» ou «não condicionado». Para compreender esta noção será preciso referirmo-nos à teoria tradicional dos elementos eternos, omnipresentes e universais. Segundo esta teoria, o fogo, por exemplo, existe em todo o lado como elemento, idêntico a si próprio, fora do espaço e do tempo; os processos de combustão não o «produzem», fornecem somente as condições que normalmente são necessárias para a sua aparição num dado lugar e momento. Um yogui pode, contudo, evocar também o fogo «em si próprio», sem nenhuma destas condições. Concebe-se duma maneira análoga um prazer não gerado, contínuo, fora do espaço e do tempo, ou seja, o prazer relativo à união eterna do masculino e do feminino cósmicos — mitologicamente: do Deus e da Deusa, de Çiva e de Çakti, de Radha e de Krishna. O prazer experimentado em dado momento por um casal de amantes não seria senão uma aparição particular, fugitiva no tempo, ligada às condicionalidades quer fisiológicas, quer psico-emotivas das cópulas humanas, desse prazer «que não vem e não vai». Ora nestas uniões mágico-rituais tântricas, produzir-se-ia, justamente, o afloramento do «prazer em si», atemporal, ligado ao estado não-dual, à unidade suprema, ao incondicionado (46). O orgasmo que nas uniões normais é vivido num só instante, de modo impreciso, no momento em que o sêmen é vertido na mulher e por ela captado, essa sensação-limite é, neste caso, «fixada» ou estabilizada através duma alteração de plano; dá origem a um estado contínuo («sem fim») que deixa de ser condicionado fisiologicamente e que é considerado, sobretudo pelos Tantra budistas, como o limiar da Grande Libertação e da «iluminação perfeita». A vaga de prazer que se eleva torna-se idêntica à do pensamento-iluminação (bodhicitta) que se inflama e sobe de baixo até à cabeça, como no yoga.
Essa continuidade, tal como acontece com a chama e com o combustível, é alimentada pela substância subtil da mulher; entra aqui em causa aquilo a que, no texto anteriormente citado, se chamou a absorção do rajas no estado em que o sémen é suspendido. Desenvolve-se, assim, a união alquímica do Çiva sem movimento, fixo através da substância da sua esposa, ativo num certo sentido, e que no final conduz para lá do momento unicamente extático.
Não é possível deduzir claramente destes textos se, no ato sexual, a técnica da suspensão deve ser praticada não só pelo homem, mas também pela mudrâ ou çakti, isto é, pela sua companheira. É um fato que se prevê para a mulher uma técnica correspondente, chamada amaroli-mudrâ, porém separadamente, e enumeram-se ( 47) os poderes especiais que ela conferiria à mulher sem que se faça qualquer alusão a um sincronismo com o ato análogo praticado pelo homem. De qualquer modo, a técnica prevista para a mulher confirma o lado não fisiológico destes métodos. No caso da mulher não se trata, com efeito, de inibir um processo de ejaculação e de reter uma substância comparável ao sêmen masculino; como é do conhecimento geral, a mulher tem secreções vaginais e, em parte, uterinas, segregadas sobretudo pelas glândulas de Bartholin (secreções a que os tratados hindus de erótica profana chamam «água de amor» ou «água do deus do amor») e que começam geralmente a manifestar-se com o seu estado geral de excitação sexual, sem estarem localizadas num único momento de crise, como sucede com o homem durante a ejaculação. A palavra rajas, aquela que é mais empregada nos textos tântricos, tem diversos significados. Um deles é «mênstruo». Evidentemente não se trata, por parte da mulher, de suspender nada de semelhante durante a cópula; seria talvez a força cujo afloramento e irrupção se faz sentir no acume erótico, que, neste caso, a mulher deveria também colher e fixar: esta força é, na mulher, a contrapartida da vîrya, a virilidade transcendente do homem, e significaria para o mênstruo aquilo que a vîrya significa para o sêmen, como esperma. Era esta a força que os Antigos concebiam como o «sêmen feminino», necessário, na sua opinião, à procriação. Apressaram-se demasiado a declarar errada e fantasista esta concepção, que foi também professada na Europa até ao século XVII, pelo fato de essa teoria estar casualmente associada aos mênstruos e às secreções vaginais.
O «sémen feminino» apresenta, tal como a vîrya, um caráter hiper-físico; mas se considerarmos tudo o que, de um modo geral, constitui normalmente na mulher o contributo necessário para a procriação, poderemos, com razão, falar dum todo psicofísico, que no seu aspecto físico compreende também os mênstruos e as secreções. Quando entre os Tantra se fala do sêmen masculino e feminino como de dois princípios que, ao unirem-se, geram a corrente ascendente da iluminação, do mesmo modo que no ato sexual comum, o espermatozóide e o óvulo unindo-se geram o primeiro núcleo do embrião, referem-se efetivamente a essas contrapartidas hiperfísicas, destacadas, retidas, fixadas e levadas a fundir-se. Não é em vão que nos textos do Vajrayâna se estabelecem correspondências entre elas e as duas correntes, idâ e pingalâ ou lalanâ e rasanâ, que no yoga puro, ascético, são, como já nos referimos, suspendidas e levadas a fundir-se ( 48). Ao pretender-se traduzir rajas por mênstruos e, além disso, ao querer considerá-los no seu sentido próprio, o mênstruo poderia também ser compreendido em função dessa força mágica ambígua ou mana especial a que já nos referimos (cf. § 36); a sua retenção estaria relacionada com a conversão completa da possibilidade maternal da mulher, numa possibilidade puramente afrodisíaca, com o possível efeito correspondente duma saturação fascinante-demoníaca sexual no tipo em questão. E, contudo, possível considerar um outro significado do termo sânscrito rajas. Além de significar vermelho (daí lhe advindo a relação com os mênstruos, além do sentido filosófico que lhe é próprio na doutrina dos gema, além do de pólen ou pó duma flor (em especial o lótus) existe para o rajas um sentido sinônimo de tejas, o fogo ou a energia radiante. Isto reconduz-nos exatamente à natureza da substância subtil da mulher, considerada nestes termos nos textos antigos, ao compararem a união sexual a um sacrifício pelo fogo, e a mulher, ou os seus órgãos sexuais, à chama desse mesmo fogo ( 49). E a substância que alimenta o processo de dissolução e de união extática durante o ato sexual mágico. Eis os termos duma antiga inscrição egípcia que talvez não tenham um sentido unicamente profano: «Tal como o fogo, arde o corpo da mulher.»
Para tornar inteligível a teoria de que o estado transcendente se produz através da união do çukra com o rajas, e dado que no presente contexto se não podem considerar estes termos no sentido literal, material (esperma e mênstruos) necessário será referirmo-nos aos dois princípios masculino e feminino que se deve estar em condição de fixar impedindo a dissipação e a degradação no processo fisiológico animal, e assim supor uma intervenção síncrona da mulher no samarasa. Diz-se, com efeito, nos Dohâkoça, que deve ser imobilizado não somente o çukra mas também o rajas (o «sêmen feminino») para que se produza o estado a que aspira todo este procedimento ( 50). Somente nas práticas sexuais taoístas, que têm, em parte, uma orientação diferente, é que parece não ser este o caso, ou pelo menos, não o ser sempre. Paracelso escreveu: «Deus pré-ordenou o nascimento, de modo que a fantasia resida nas duas pessoas, ajustando-se a imaginação de uma à da outra, a do homem à da mulher e vice-versa. Porque o homem só não tem senão metade da imaginação; mas junto com a mulher têm-na por inteiro (51).» Esta idéia de Paracelso poderia também aplicar-se com propriedade à situação que acabamos de analisar: a integração de duas imaginações vivas, que se encontram magnetizadas pelo desejo, deve constituir com certeza a contrapartida interna, oculta, do regime tântrico da cópula.
Analisando, finalmente, a cooperação da mulher no processo de fixação, parece que essa cooperação seria necessária por uma razão de ordem prática, no caso de, dada a posição ritual invertida, a mudrâ ter de desempenhar o papel ativo. Ao abandonarem-se, porém, ao curso normal, às crises e às sincopes da experiência erótica, é evidente que poucas mulheres conseguiriam continuar a desempenhar este papel e com o seu desfalecimento suspenderiam todo o processo.
Quanto ao resto, será interessante chamar a atenção para algumas expressões curiosas da escola Sahajiya, relacionadas com e regime do ato sexual: «No amor reside o frêmito da alegria, sobre este frêmito o fluxo (a passagem ao estado contínuo) e existe o fluxo por cima do fluxo (trata-se da intervenção do novo estado por fixação).» «Existe água sobre a terra e sobre esta água nasce a vaga; o amor mantém-se por cima desta vaga (referência à superação da crise erótica): existe alguém que conheça isto? (52)» E ainda: «Mergulhar nas profundezas do oceano sem, de modo algum, se banhar», «atar um elefante com um fio de aranha» (53) : eis algumas alusões a pormenores da arte interior que se deve pôr em prática. Referimo-nos já à imagem de «cavalgar um tigre» ou, por outras palavras, de uma situação que não admite, sob pena de provocar conseqüências muito graves, a desistência, pois então o tigre saltaria sobre aquele que se deixou cair e dominá-loia. Falaremos mais adiante das conseqüências do abortar desta prática.
Acrescentemos algumas palavras sobre o gênero de preparação requerida por estas práticas nas suas formas superiores. A regra é que a jovem deve ser primeiramente «adorada» e depois «possuída» (e no ritual, mesmo no das práticas coletivas, indicam-se duas posições distintas do casal estando a mulher à direita do homem na primeira fase, e à esquerda na segunda). «Adorar» significa, no seu grau mais elevado «tornar o objeto dum culto», realizando através da mulher a presença da deusa, de Tãrâ, daquela que dá a salvação ou de outras imagens cultuais e vitalizadas do princípio feminino; existe aqui, de certo modo, uma correspondência com o culto da mulher próprio dos «Fiéis do Amor» medievais. Como pormenor interessante, indicamos, que na fase de adoração, embora pertença ao homem a natureza de Krishna (o macho divino), lhe é freqüentemente atribuída a natureza de Rãdhâ, isto é, de mulher. Isto pode ser explicado no sentido de que o homem não possui a verdadeira virilidade, e pertence ao feminino enquanto estiver no domínio profano; devendo abandonar a pretensão de ser já um purusha (a encarnação da verdadeira virilidade, sem movimento), se quiser penetrar no domínio do eterno (54). É talvez seguindo uma linha de pensamento idêntico que na mística se atribui freqüentemente à alma um papel feminino, o duma esposa ou noiva perante o amante celeste. Esta relação mantém-se, por vezes, no tantrismo vishnuita mas trata-se nesse caso de exceções e de deturpações da concepção central. O processo desenvolve-se, no seu conjunto, no sentido duma superação desta condição e de uma inversão de polaridade: como já vimos, a mulher adorada primeiramente como a encarnação viva da deusa e detentora do supra-sensível, da força salutar e iluminante, é depois possuída e passa da direita para a esquerda.
Foi possível recolher dum manuscrito bengalês, resumido por Mahindra Mohan Bose (55) vários pormenores interessantes sobre a preparação para o rito sexual. Prevê-se uma longa e difícil disciplina de alimentação e ao mesmo tempo de refreamento do desejo. Numa primeira fase o homem deverá servir a jovem (e podemos ver aqui, de certo modo, um equivalente técnico do «serviço de amor» medieval) e dormir a seus pés, no mesmo quarto; seguidamente e durante quatro meses, partilhará o seu leito, tendo-a à sua direita, posição que, como acabamos de ver, corresponde à fase de «adoração»; durante quatro meses dormirá com ela tendo-a então à sua esquerda, desejando-a sempre, mas sem contatos corporais. Só depois deste lapso de tempo é admitido o ato sexual. No seu conjunto a finalidade deste procedimento, bastante formalista, é evidentemente dupla: por um lado alimentar um desejo subtilizado e exasperado pela vizinhança, sem contatos, com a mulher quase numa quintessência tecnicizada do amor platônico; em segundo lugar, desenvolver o autodomínio até a um grau em que, durante o ato sexual, o abraço da mulher e a identificação dissolutiva com a sua substância fluídica, com o seu rajas, esse domínio permita reter o sêmen e desviar a onda no acume da crise erótica, do orgasmo.
É possível falar-se, assim, duma ascese preliminar sui generis, assim como para objetivo supremo que se procura atingir através destas técnicas se considera ter havido uma realização supra–ascética, diferente dos êxtases místicos. Isto é aparente sobretudo no tantrismo budista, isto é, no Vajrayãna. Estas escolas chegaram à concepção dum Buda muito diferente da sua imagem habitual, um Buda que teria vencido Mâra, o deus da terra e da morte, e teria chegado à iluminação absoluta, conquistando ainda outros poderes sobrenaturais, graças aos ritos de magia sexual e à sua união com as mulheres («elas são as divindades, elas são a vida» — é uma expressão que um texto atribui a Buda (56). Por outro lado, não se trata aqui do sexo concebido somente como um dos meios para atingir o Nirvana. Aquilo que queremos especificamente sublinhar é que no Vajrayâna o estado supremo da mahâsukha, em que o Buda se uniu à Çakti, está hierarquicamente colocado para além do próprio estado do nirvana considerado unilateralmente, isto é, como um êxtase separado do mundo. É a essência da doutrina do «quarto corpo» dos Buda, denominado mahâsukha-Kâya; ao unirem-se com Çakti uniram-se com a raiz de toda a manifestação, o que equivale a afirmar que são os senhores da imanência (samsâra) assim como da transcendência (nirvana): termos que nestas escolas deixam de constituir uma oposição. Quanto ao conteúdo da experiência, poderemos pensar no superamento do estado extático ou de simples excessus mentis, se o concebermos de um modo passivo, «místico». Este é, de resto, um objetivo que outras correntes da metafísica hindu procuram também atingir. Diz-se por exemplo: «Não permitas ao mental gozar da felicidade que lhe advém da condição extática (samâhdi), mas liberta-o por meio da prática da discriminação, do apego que se sente por essa felicidade (57).»
De um modo geral, é possível descobrir sentidos análogos no simbolismo e na terminologia das escolas de que acabamos de falar. Se se conceber que cada homem é potencialmente um Buda, a mulher utilizada terá, para além do nome de mudrâ (cujo significado já explicámos) e de çakti (visto incarnar a Çakti de forma tangível) também o nome de vidyâ, que significa «conhecimento» num sentido que se confunde freqüentemente com prajnâ = iluminação; isto equivale a dizer que a mulher incorpora o princípio capaz de despertar a qualidade potencial «buda» do homem. Na mesma ordem de ideias através das quais a mulher dos «Fiéis do Amor» sensibiliza a «Madonna Intelligenza», a Gnose salvadora, a Santa Sapiência que faz a «inteligência possível» do amante (cf. § 47) passar ao ato, tornar-se-á aqui o símbolo vivo da prajnâ (iluminação) encerrando-a no mais profundo do ser. Além disso, o mistério da realização é frequentemente indicado nestas escolas por meio do simbolismo da união de padma e de vajra; estes dois termos são também polivalentes, porque admitem simultaneamente um sentido abstrato, metafísico, doutrinal e um sentido sexual concreto. Podem aludir quer ao órgão sexual feminino e masculino quer à «matriz dos Budas», por um lado, e por outro ao ceptrorelâmpago, ou ao «diamante» (que constituem os símbolos da força e do princípio fixo, incorruptível e soberano do ser). Noutros casos, os termos empregados são prajnâ e upâya, isto é, por um lado a força-iluminação, a técnica, o «meio apropriado», ou «o poder atuante» por outro, os quais, unindo-se, conduzem à realização suprema. Trata-se aqui, de novo, duma união que é, por vezes, concebida em termos abstratos, metafísicos, somente espirituais, e outras vezes num quadro que implica a união do princípio masculino com o princípio feminino através do ato sexual realizado por um homem e uma mulher, existindo uma correspondência ontológica, mágica e analógica entre esses princípios e as expressões upâya e prajnâ acima citadas (58). A conclusão a tirar deste conjunto, e que desejamos sublinhar, é a acentuação que obtém o princípio masculino pelo fato de se atribuir um caráter feminino à força-iluminação e de no simbolismo hierogâmico ela desempenhar o papel de mulher possuída pelo macho no ato sexual, reconhecendo-se, dum modo geral, que o vajra possa assumir um sentido fálico (59). Teremos, assim, um índice sinalético para a direção «mágica» destas correntes; e somos, em certa medida, reconduzidos às afirmações que fizemos já acerca da morte de Beatriz e de Raquel, e do simbolismo hermético do incesto.
Poderemos perguntar em que medida as práticas sexuais tântricas conduzem aos mesmos resultados que o despertar puramente yóguico da Kundalinî. E por de mais evidente que nestes textos se julga este despertar possível mesmo através da utilização da mulher, enquanto que nós já tínhamos a seu tempo considerado fenômenos da própria vida sexual profana (em certos casos de hebefrenia) que se podem provavelmente considerar como efeitos dum despertar parcial de força basal. A fisiologia hiper-física do Yoga refere-se a um centro denominado yonishthâna, próximo daquele em que «dorme» Kundalini e diz-se que nele, sob o signo do desejo carnal, se pode produzir uma união entre Çiva e Çakti, quase como que uma antecipação ou um reflexo da união suprema que, segundo o ensinamento yóguico, se realiza no alto, na região coronal. Este fato faz-nos igualmente pensar na possibilidade duma convergência das duas técnicas. Existem, além disso, textos em que a mulher amada e possuída é apresentada como o símbolo vivo da própria Kundalinî ou candâli. O ponto de vista que predomina é o de que, graças às práticas sexuais somente será possível atingir transitoriamente o sahaja, o estado superior, o estado não-dual para lá do Eu e do não-Eu, sendo porém difícil de estabilizar esta conquista como se se tratasse unicamente dum «golpe de mão», não se podendo realizar todas as operações contempladas pelo Yoga com a Kundalinî, em ascensão. E essa precisamente a objeção que os meios do Yoga puro fazem às práticas acima indicadas ( 60). Os textos do tantrismo budista, baseados nestes fatos, referem-se, por vezes, também a mestres, que depois de terem chegado à iluminação através de práticas sexuais, se mantiveram afastados das mulheres seguindo uma outra via, proclamando uma doutrina severa. O mesmo não sucede nos meios Siddha e Kaula, para não mencionarmos organizações onde a estas práticas foi dada até uma direção de magia operativa.
Se, como pudemos observar no Yoga, as consequências dum despertar mal conduzido da Kundalinî podem ser a doença, a loucura ou a morte, é evidente que existe igualmente um risco idêntico nas práticas sexuais, correndo-se até o perigo de que seja maior visto que, e atendendo à orientação congênita da sexualidade humana, se torna mais difícil controlar todo o processo e orientá-lo no devido sentido. Se, no ato sexual, o bindu (termo técnico que designa o sêmen e o princípio que lhe corresponde) «cai», não resultará uma libertação, mas um vínculo bem mais temível ( 61). Esse perigo poderá ser, em particular, uma completa intoxicação sexual; ao absorver nas camadas mais profundas do ser a força feminina, ao ativar a energia elementar do sexo e do desejo, se não se produzir a transmutação, a inversão da polaridade, por se manter predominante a tendência ao simples prazer ávido nem que tal suceda só no inconsciente, a consequência poderá ser uma intoxicação fatal para o ser. Dir-se-á, neste caso, que da condição de homem se poderá retrogradar para a condição dum «demônio», dum instrumento de força de que só quereria servir-se como simples meio. Este é também o perigo daquilo que alguns denominaram a «magia vermelha». Enquanto que nas formas superiores das práticas do tipo tântrico é próprio empregar-se a experiências do sexo como um meio, sucede o contrário na «magia vermelha», que se serve dos contatos com o supra-sensível (por vezes com o auxílio de substâncias análogas aos estupefacientes) a fim de intensificar a experiência sexual, e, em especial, para prolongar anormalmente a duração do orgasmo e do prazer, sem contudo lhes modificar a natureza no sentido acima indicado. O perigo das práticas de tipo tântrico é justamente o de terminarem neste plano, sem disso se darem conta.
Conhece-se um mito grego que pode ser considerado como uma dramatização deste resultado abortivo: trata-se do mito da túnica de Nessus. Para que Héracles se unisse a ela pelo amor e pelo desejo, Dejanira envia-lhe uma magnífica túnica que tinha recebido de Nessus, embebida num filtro de amor; tratava-se, porém, dum filtro de morte, de tal modo que Héracles sentiu o seu corpo envenenado e as veias queimadas por uma chama inextinguível. O suicídio de Dejanira foi inútil. Somente o pôde salvar a sua transfiguração sacrificial pelo fogo no monte Oeta onde, todavia, sofreu a fulminação divina; através dela foi Héracles transportado para o Olimpo onde desposou Hebe, a juventude eterna. São claramente visíveis neste mito os significados profundos válidos para a série de fatos de que acabamos de falar. A mulher elementar que se evocou, absorveu e se fez entrar no íntimo, pode transformar-se no princípio duma sede mortal e inextinguível. Nesse caso, só o fulminar olímpico poderá reconduzir ao objetivo original, imortalizante da união.
Esta situação obsessiva é descrita de forma sugestiva num romance de G. Meyrink, que se relaciona exatamente com as idéias do tantrismo. Nele se descreve um personagem que sucumbe ao poder da deusa que, numa das suas encarnações especiais, se ativou numa mulher, e perde, assim, o princípio da virilidade sobrenatural (simbolizada aqui por um punhal-lança correspondendo ao ceptrodiamante — ao vajra — da doutrina oriental). A mulher, já conhecida fisicamente, passa então a agir duma maneira hipersensível ou subtil tomando o aspeto duma imagem fascinante e alucinante «através dos seus olhos, do seu corpo, de todo o seu ser sem piedade». O personagem em questão exprime-se assim: «O súcuba apoderou-se completamente dos meus sentidos… foi como que uma sede contínua, mortal, até ao limite em que ou a taça se quebra em pedaços, ou o próprio Deus abre o cárcere… O meu tormento centuplicou-se porque Assia chegou ao ponto de atuar num plano mais profundo, menos tangível, dos meus sentidos, embora não deixasse de fazer sentir a sua proximidade absorvente. Embora a minha vontade tivesse tentado suprimi-la, no início, essa mesma vontade voltava-se presentemente contra mim e eu sentia-me arder de desejo por ela.» Em mil imagens fascinantes apareceu-lhe então «a Nua, a Sugadora, a Dissolvente», e idêntica nas últimas imagens de febre, de desejo, e de nudez, a mulher começa a «envolvê-lo na sua aura, a penetrar progressivamente nele e à sua volta», até que ele sente ter chegado «ao limite da perdição, no limiar daquilo a que os Sábios chamaram o oitavo mundo, o mundo da destruição completa» (62).
Recordemos, finalmente, que segundo os textos hindus aquele que pretende executar as técnicas sexuais que conduzem ao mahá-sukha deve, além de possuir um perfeito autodomínio, dispor dum corpo são, fortificado pelas disciplinas do Yoga físico; de outro modo, o mahá-sukha, isto é, o êxtase do estado de união, conduzirá a um obscurecimento dos sentidos, «a algo de parecido com um desmaio» (63). Este pormenor é importante pois podemos reconhecer nele uma relação com os estados negativos que, até na erótica profana, e em particular na mulher, se manifestam durante o ato sexual substituindo a experiência transfiguradora.
Detivemo-nos com uma certa demora nos ritos sexuais tântricos, porque eles nos apresentam de modo suficientemente visível e interligados todos os temas principais com que deparamos ao abordar a metafísica do sexo, quer no domínio profano, em formas não intencionais, passivas e tendências, quer no domínio das sacralizações tradicionais. Encontramos, com efeito, nestes ritos o regime das evocações, a aparição e a ativação no indivíduo de um ou de outro sexo, do poder que constitui a sua natureza ou raiz ontológica mais profunda. Do mesmo modo, e constituindo como que a parte dum todo, aí se considera o regime do desejo «platônico», o estado subtilizado, psíquico, da embriaguez que é a essência de todo o eros, enquanto que nas práticas constitui uma pressuposição bem definida a independência potencial perante as condicionalidades fisiológicas comuns desse desejo e até do acume do prazer obtido durante o ato sexual. A associação entre a morte e o amor (o amor que mata, morrer de amor, a «morte» durante o espasmo, no orgasmo e no delírio físico) passa aqui do plano romântico ou simplesmente emocional para o plano efetivo, objetivo, duma técnica iniciática, numa experiência onde, à solução de continuidade, ao sucumbimento (que na maioria dos homens corresponde ao traumatismo ou à última crise provocada pela união com a mulher) se substitui uma presença que acompanha ou determina a ruptura de nível, e «morte do mental», a fulminação do «pensamento-iluminação» para lá do estado «dual».
Finalmente, confirmam-se quer a doutrina do andrógino, como chave da metafísica do sexo, quer a ideia de que a sexualidade na sua função de procriação animal constitui uma queda, através das técnicas de inversão de polaridade e de retenção do sêmen, tal como a concepção da Kundalinî a qual, despertada, se torna força que em lugar de alimentar o ciclo da procriação e de reforçar o seu vínculo, conduz ao sahaja, ao sem-morte, ao incondicionado. Nestas tradições encontra-se, portanto, um conjunto típico onde os diferentes elementos se ligam, tal como os elos duma cadeia única, dando o sentido exato do todo de que se deve partir para uma compreensão mais profunda dos fenômenos particulares, dos aspectos e possibilidades do eros e do amor sexual.
Referir-nos-emos seguidamente a outras tradições secretas situadas na mesma linha de ensinamentos tântricos; os dados que se puderam recolher serão contudo mais fragmentários e não será possível encontrar sempre a mesma clareza ou o mesmo nível quanto às finalidades superiores destes processos.
NOTAS
40 Hathayogapradî p ikâ, III, 85, 87-90.
41 Cfr. G. Tucci, Tibetan painted Scrolls, Roma, 1949, v. I, pág. 242.
42 Op. cit., pág. 255.
43 Fala-se efetivamente duma «morte no amor» e afirma-se: «Somente aquele que a conhece vive verdadeiramente através da morte no amor», cfr. DAS GUPTA, op. cit., pág. 160.
44 H. von GLASENAPP, Buddhistische Mysterien, Estugarda, 1940, pág. 56.
45 Assim na seguinte tradução desta passagem de Kânha (Dohâ-koça, v. 19): «Aquele que dominou o rei do seu espírito mediante a identidade do prazer (samarasa) no estado do Inato (sahaja) torna-se imediatamente um mago; não teme a velhice nem a morte» (apud Eliade, pág. 268).
46 Diz-se que em certas experiências de além -túmulo, se experimenta, no estado transcendente e contínuo, esse prazer «não gerado» (cfr. G. Tucci, Il Libro Tibetano del Morto, Milão, 1949, págs. 130, 201). É possível que seja esse prazer que surge incidentalmente em certos temperament os anormais, nos casos em que se produz uma repetição ininterrupta do fenómeno liminal do orgasmo sexual, durante um ato sexual ou então no decorrer do mesmo dia; Kinsey cita nos seus relatórios casos em que esse fenômeno se verifica um número inconcebível de vezes por dia, sobretudo nas mulheres; uma vez que a separação enire o fato psíquico -emotivo e as condicionalidades fisio lógicas mais grosseiras é mais fácil neste sexo. Se, nestes casos, persiste o nível normal, físico da consciência, entrar-se-á no domínio da patologia, que, como já afirmámos, seria rica de ensinamentos se fosse estudada a par tir de pontos de referência esotéricos apropriados.
47 Hathayogapradîpikâ, III, 92-101.
48 Cfr. ‘rum, Tibetan painted Scrolls, cit., v. I, pág. 242.
49 Quando se fala de uniões, designa-se freqüentemente a mulher por suryâ, isto é, o sol posto no feminino. Isto conduz-nos ao aspeto, de certo modo positivo desta energia, ao seu aspeto de «esplendor». Nesta mesma ordem de idéias, poderemos recordar que na Hélade certos tipos de mulheres fascinantes e «mágicas». como Circe e Medeia, foram também consideradas como Helíades, isto é, de descendência «solar», cfr. K. KERÉNYI, Le Figlie del Sole, Turim, 1949. Poderíamos citar como correspondências, num plano muito mais condicionado, as sensações exprimidas pelos poetas, por exemplo: na presença da amante ele tinha sempre a «sensação de estar envolto de um éter inflamado, duma aura vibrante» e deste modo lembrou-se como em certa noite, quando era ainda criança, «ao atravessar um terreno deserto se sentiu subitamente envolvido por fogos-fátuos, tendo lançado um grito» (D’ANNUNZIO). Sobre o efeito do hálito da respiração feminina: «E para além dos sentidos a alma alcança um perfume selvagem e penetrante. como que um orvalho ardente, que se dissolve no seio de um botão gelado» (SHELLEY). A. LÉGER: «Oh mulher, e febre feita mulher! Os lábios que te saborearam não experimentarão a morte.»
50 Cfr. ELIADE, Yoga, cit., pág. 261.
51 Scritti scelti, Milão, 1943, pág. 139
52 In Das GUPTA, op. cit., pág. 167.
53 Ibid., pág. 163.
54 Ibid., págs. 145-146.
55 An introdution to the study of the post-chaitanya sahajiyâ cult, págs. 77, 78, apud ELIADE.
56 De La VALLÉE Poussin, Boudhisme, cit., pág. 144.
57 Mândfka-upanishad, II, 45 (comm).
58 DAS GUPTA, op. cit., pág. XXXVIII.
59 Também relativamente aos dois princípios concebidos um como «iluminação», prajnâ, e o outro como força operante, upâya, indicam-se correspondências relativas à fisiologia hiperbiológica em termos análogos aos do taoísmo; a primeira está situada na parte inferior do corpo, próximo do plexo solar (mais ou menos ali onde o taoísmo localiza o «espaço da força») e a segunda na cabeça. Também neste caso a prática tem por fim fazer subir a deusa do pólo inferior até ao Senhor na região do cérebro (cfr. DAS GUPTA, op. cit., pág. XXXVIII). Na iconografia tibetana do yab-yum, a mãe, yum, e o macho que ela abraça, são as correspondências de prajnâ e de upâya que, ao unir-se, provocam a subida do pensamento-iluminação (cfr. Tucci, op. cit., v. I, pág. 224).
60 Cfr. DAS GUPTA, op. cit., pág. 180. ( 2 ) Cfr. Tucci, op. cit., v. I, pág. 242
61 DAs GUPTA, O. cit., pág. 108.
62 G. MEYRinK, L’Angelo della Finestra d’Occidente, trad. it., Milão, 1949, págs. 467, 470.
63 DAs GUPTA, O. cit., pág. 108.
SOBRE O REVISOR
Ícaro Aron Soares, é colaborador fixo do PanDaemonAeon e administrador da Conhecimentos Proibidos e da Magia Sinistra. Siga ele no Instagram em @icaroaronsoares, @conhecimentosproibidos e @magiasinistra.