Bhagavad-Gita: O Conhecimento Transcendental (Capítulo 4)

Bhagavad-Gita Como Ele É, Capítulo 4

Por Srila Prabhupada, Primeira Edição, 1976. Revisão de Ícaro Aron Soares.

VERSO 01: O Bem-aventurado Senhor disse: Eu instruí esta ciência imperecível da yoga ao deus do sol, Vivasvan, e Vivasvan a instruiu a Manu, o pai da humanidade, e Manu, por sua vez, a instruiu a Iksvaku.

O Senhor Abençoado primeiro instruiu esta ciência imperecível do yoga a Vivasvan.

ILUSTRAÇÃO QUINZE: “O Bem-aventurado Senhor disse: Eu instruí essa ciência imperecível da yoga ao deus do sol, Vivasvan (acima), e Vivasvan a instruiu a Manu, o pai da humanidade (no meio), e Manu por sua vez a instruiu a Ikshvaku (abaixo).” Encontramos nesta ilustração a história do Bhagavad-gita descrita desde um tempo remoto quando foi entregue à ordem real, os reis dos diferentes planetas. Esta ciência está destinada especialmente para a proteção dos habitantes e, portanto, a ordem real deve compreendê-la para ser capaz de dirigir os cidadãos e protegê-los do cativeiro material da luxúria. (Veja Capítulo 4, Verso 1).

VERSO 02: Esta ciência suprema foi assim recebida através da corrente de sucessão discipular, e os reis santos compreenderam-na desta maneira. Mas com o passar do tempo a sucessão se rompeu e por isso a ciência como ela é parece estar perdida.

VERSO 03: Esta antiquíssima ciência da relação com o Supremo é falada hoje por Mim a você porque você é Meu devoto bem como Meu amigo; portanto, você pode compreender o mistério transcendental desta ciência.

VERSO 04: Arjuna disse: O deus do sol Vivasvan é mais velho em nascimento do que Você. Como posso compreender que no princípio Você lhe tenha instruído esta grande ciência?

VERSO 05: O Bem-aventurado Senhor disse: Tanto você quanto Eu temos passado por muitos e muitos nascimentos. Eu posso Me lembrar de todos eles, mas você não, ó subjugador do inimigo!

VERSO 06: Embora Eu não tenha nascimento e Meu corpo transcendental nunca se deteriore, e embora Eu seja o Senhor de todos os seres vivos, ainda assim Eu apareço em todo milênio em Minha forma transcendental original.

VERSO 07: Sempre e onde quer que haja um declínio na prática religiosa, Ó descendente de Bharata, e uma ascensão predominante de irreligião – aí então Eu próprio descendo.

O Senhor desce sempre que há declínio nos princípios religiosos.

ILUSTRAÇÃO DEZESSEIS: No quadro central Krishna mostra Sua forma original de duas mãos segurando a flauta. Rodeando-O encontram-se dez de Suas encarnações eternas (começando abaixo à esquerda, no sentido horário: I) Matsya, a encarnação de peixe, salva os Vedas durante a inundação do universo. 2) Kurma, a encarnação da tartaruga, sustenta a colina Mandara em Seu casco enquanto os semideuses e os demônios batem o oceano de néctar. 3) Varaha, a encarnação de javali, luta contra o demônio Hiranyaksha. 4) Nrsimhhadeva, a encarnação de metade homem, metade leão, mata o demônio Hiranyakashipu. 5) Vamana, a encarnação do belo brahmana anão, pede três passos de terra ao imperador Bali. 6) Parasurama mata os kshatriyas rebeldes. 7) Ramacandra sai ao exílio com Sua esposa Sita e seu irmão Lakshmana. 8) Krishna levanta a colina de Govardhana e perto d’Ele está Seu irmão, Balarama. 9) Buddha ensina a não-violência. 10) Kalki mata todos os demônios no fim da Kali-yuga e assim os libera. (Veja Capítulo 4, Verso 7).

VERSO 08: Para salvar os piedosos e aniquilar os canalhas bem como para restabelecer os princípios da religião, Eu próprio advenho milênio após milênio.

“Para libertar os piedosos e aniquilar os malfeitores…”

ILUSTRAÇÃO DEZESSETE: Kamsa, o rei demoníaco e tio de Krishna morre nas mãos do Senhor. O irmão de Krishna, Balarama, permanece à Sua direita e atrás estão Seus pais Vasudeva e Devaki, que foram presos por Kamsa e posteriormente liberados por Seu filho. Esta cena aconteceu na arena de Kamsa, na província de Mathura. Este incidente é uma prova da declaração de Krishna no Bhagavad-gita: “Para salvar os piedosos e aniquilar os canalhas bem como para estabelecer os princípios da religião, Eu próprio advenho milênio após milênio.” (Veja Capítulo 4, Verso 8).

VERSO 09: Ó Arjuna, aquele que conhece a natureza transcendental de Meu aparecimento e atividades, ao deixar o corpo, não nasce outra vez neste mundo material, mas alcança Minha morada eterna.

VERSO 10: Estando livres de apego, medo e ira, estando completamente absortas em Mim e refugiando-se em Mim, muitas e muitas pessoas no passado se purificaram através do conhecimento de Mim – e assim todas elas alcançaram amor transcendental por Mim.

VERSO 11: A todos eles – na medida que se rendem a Mim – Eu recompenso proporcionalmente. Todos os homens seguem Meu caminho em todos os aspectos, ó filho de Prtha.

“À medida que eles se rendem a Mim, Eu os recompenso de acordo.”

ILUSTRAÇÃO DEZOITO: Krishna diz: “A todos eles – na medida que se rendem a Mim – Eu recompenso proporcionalmente. Todos os homens seguem o Meu caminho em todos os aspectos, ó filho de Prtha.” Todo mundo busca Krishna nos diferentes aspectos de Suas manifestações. Krishna recompensa igualmente a todos os devotos de acordo com suas diferentes intensidades de amor por Ele. Sobre as pétalas de lótus do mundo espiritual, Krishna dança com as gopis em amor conjugal e também corresponde com Seus devotos como filho, como amigo, como senhor e como o objeto de estima. Abaixo, Krishna aparece em uma ilustração perante Seu devoto, que se encontra no mundo material, e absorve o yogi impersonalista nos raios divinos de Sua refulgência corpórea. Ele concede poder místico ao yogi exibicionista e outorga ao trabalhador fruitivo os frutos materiais de seu trabalho. (Veja Capítulo 4, Verso 11).

VERSO 12: Os homens neste mundo desejam o êxito nas atividades fruitivas, e por isso adoram aos semideuses. Rapidamente, é claro, os homens conseguem os resultados do trabalho fruitivo neste mundo.

VERSO 13: As quatro divisões da sociedade humana foram criadas por Mim, de acordo com os três modos da natureza material e o trabalho atribuído a eles. E, embora Eu seja o criador deste sistema de trabalho, você deve saber que Eu, sendo imutável, não trabalho.

VERSO 14: Não há trabalho que Me afete; nem Eu aspiro aos frutos da ação. Aquele que compreende esta verdade sobre Mim tampouco se envolve nas reações fruitivas do trabalho.

VERSO 15: Todas as almas liberadas nos tempos remotos agiram com esta compreensão e assim alcançaram a liberação. Portanto, como os antigos, você deve executar seu dever com esta consciência divina.

VERSO 16: Mesmo as pessoas inteligentes se confundem em determinar o que é ação e o que é inação. Agora explicarei a você o que é ação, e com este conhecimento você estará liberado de todos os pecados.

VERSO 17: As complexidades da ação são muito difíceis de se compreender. Portanto, deve-se saber propriamente o que é ação, o que é ação proibida e o que é inação.

VERSO 18: A pessoa que vê inação na ação e ação na inação é inteligente entre os homens, e está na posição transcendental, ainda que se ocupe em toda classe de atividades.

VERSO 19: Compreende-se que uma pessoa está em pleno conhecimento quando todos os seus atos estão desprovidos de desejo por gratificação dos sentidos. Esta pessoa é considerada pelos sábios como um trabalhador cuja ação fruitiva é queimada pelo fogo do conhecimento perfeito.

VERSO 20: Abandonando todo o apego aos resultados de suas atividades, sempre satisfeita e independente, esta pessoa não executa nenhuma ação fruitiva, apesar de estar ocupada em todos os tipos de tarefas.

VERSO 21: Tal pessoa de compreensão age com a mente e a inteligência perfeitamente controladas, renuncia a todo o sentido de propriedade sobre suas posses e age unicamente para as necessidades mínimas da vida. Trabalhando assim, ela não se afeta pelas reações pecaminosas.

VERSO 22: Aquele que se satisfaz com os ganhos que vêm por si mesmos, que está livre da dualidade e não inveja, que é estável tanto no êxito como no fracasso, nunca se envolve, embora execute ações.

VERSO 23: O trabalho de um homem que está desapegado dos modos da natureza material e que está completamente situado em conhecimento transcendental, funde-se inteiramente na transcendência.

VERSO 24: É seguro que uma pessoa completamente absorta em consciência de Krishna alcançará o reino espiritual por causa de sua plena contribuição às atividades espirituais, nas quais a consumação é absoluta e aquilo que se oferece é da mesma natureza espiritual.

VERSO 25: Alguns yogis adoram perfeitamente aos semideuses, oferecendo-lhes diferentes sacrifícios, e alguns deles oferecem sacrifícios no fogo do Brahman Supremo.

VERSO 26: Alguns deles sacrificam o processo de ouvir e os sentidos no fogo da mente controlada, e outros sacrificam os objetos dos sentidos, tais como o som, no fogo de sacrifício.

VERSO 27: Aqueles que se interessam em autorrealização, em função do controle da mente e dos sentidos, oferecem as funções de todos os sentidos, bem como a força vital (alento), como oblações no fogo da mente controlada.

VERSO 28: Há outros que, iluminados por sacrificarem suas posses materiais em austeridades severas, fazem votos estritos e praticam a yoga do misticismo óctuplo, e outros estudam os Vedas para o avanço·no conhecimento transcendental.

VERSO 29: E há mesmo outros que estão inclinados ao processo de restrição da respiração para permanecer em transe, e praticam o cessar do movimento do alento que sai no alento que entra, e do alento que entra no alento que sai, e assim no final ficam em transe, suspendendo toda a respiração. Alguns deles, restringindo o processo alimentar, oferecem o alento que sai em si mesmo como um sacrifício.

VERSO 30: Todos estes executores que conhecem o significado de sacrifício se purificam da reação pecaminosa, e, tendo saboreado o néctar dos restos de tal sacrifício, vão para a suprema atmosfera eterna.

VERSO 31: Ó melhor da dinastia de Kuru, se sem sacrifício uma pessoa jamais pode viver feliz neste planeta ou nesta vida, o que dizer então da próxima?

VERSO 32: Nos Vedas se aprovam todos estes diferentes tipos de sacrifício, e todos eles nascem de diferentes tipos de trabalho. Conhecendo-os como tal, você se liberará.

VERSO 33: Ó castigador do inimigo, o sacrifício do conhecimento é superior ao sacrifício das posses materiais. O filho de Prtha, depois de tudo, o sacrifício do trabalho culmina em conhecimento transcendental.

VERSO 34: Tente aprender a verdade simplesmente aproximando-se de um mestre espiritual. Indague dele submissamente e renda-lhe serviço. A alma autorrealizada pode lhe dar conhecimento porque viu a verdade.

VERSO 35: E quando você tiver então aprendido a verdade, saberá que todos os seres vivos são apenas parte de Mim – e que eles estão em Mim, e são Meus.

VERSO 36: Mesmo que você seja considerado o mais pecaminoso de todos os pecadores, quando você estiver situado no barco do conhecimento transcendental, será capaz de atravessar o oceano das misérias.

VERSO 37: Ó Arjuna, assim como o fogo ardente converte a lenha em cinzas, assim também o fogo do conhecimento reduz a cinzas todas as reações das atividades materiais.

VERSO 38: Neste mundo, não há nada tão sublime e puro como o conhecimento transcendental. Este conhecimento é o fruto maduro de todo o misticismo. E aquele que o alcançou, desfruta do eu que está dentro de si mesmo no devido curso do tempo.

VERSO 39: Um homem fiel que está absorto em conhecimento transcendental e que subjuga seus sentidos, alcança rapidamente a suprema paz espiritual.

VERSO 40: Mas as pessoas ignorantes e infiéis que duvidam das escrituras reveladas, não alcançam a consciência de Deus. Para a alma que duvida não há felicidade nem neste mundo nem no próximo.

VERSO 41: Por isso, aquele que renunciou aos frutos de sua ação, cujas dúvidas são destruídas pelo conhecimento transcendental e que está firmemente situado no eu, não é preso pelos trabalhos, ó conquistador de riquezas.

VERSO 42: Portanto, as dúvidas que surgiram em seu coração por causa da ignorância devem ser cortadas com a arma do conhecimento. Armado com a yoga, ó Bharata, levante-se e lute!

FONTE

Srila Prabhupada. Bhagavad-gita Como Ele É, 1ª Edição.

© The Bhaktivedanta Book Trust 1976.

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